Diante de tantas inovações tecnológicas, de um mundo acelerado e de infinitas ofertas que estimulam o consumo, o que podemos entender hoje como LUXO na arquitetura e no desenho de interiores?
Tínhamos como referências de luxo objetos raros, caros ou exclusivos. Viver luxuosamente nos remetia à ostentação e a estar rodeado de coisas caras e supérfluas. Por outro lado, a busca por uma “vida simples” poderia ser traduzida por “viver sem nenhum luxo”.
Hoje o conceito expandiu para questões como sustentabilidade, reuso, busca pela identidade cultural e de nossas raízes e autoconhecimento. O luxo agora não se refere a acumular coisas, e sim experiências. Está muito ligado a um estilo de vida consciente, tanto no âmbito social quanto ambiental e também se reflete na própria diversidade de ser humano.
Mas, por que essas questões se tornaram uma nova abordagem de luxo?
Diante da já muito debatida questão do esgotamento dos recursos naturais, é fundamental pensarmos em nossas vidas interligadas com nosso meio ambiente, afinal somos partes de um todo.
Durante as últimas décadas, temas como desenvolvimento sustentável foram destacados como primordiais para a saúde do nosso planeta. A preocupação com as gerações futuras é essencial. E com as mudanças cada vez mais rápidas, a superpopulação, a tecnologia se desenvolvendo de forma exponencial, a nossa relação com o planeta também precisa mudar. Sem essa mudança de comportamento e um consumo mais consciente, é provável que não precisemos esperar pelas gerações futuras para vivermos as consequências da escassez dos recursos naturais.
Por isso , no ramo da Arquitetura, cada vez mais há a preocupação por construções que se encaixam no conceito de Green Buildings. Cuidado no uso dos recursos hídricos, no consumo energético, processos ambientalmente responsáveis desde o conceito até a conclusão da obra, passando também por sua manutenção, renovação e até mesmo demolição. Construções verdes prezam a sustentabilidade em todo o seu processo de vida, buscam cumprir sua função, causando o mínimo impacto possível no nosso planeta. Mais do que isso, através de edifícios sustentáveis podemos não só minimizar o impacto negativo da construção, como gerar impactos positivos, como geração de energia, integração do homem com a natureza, conforto térmico e acústico, proporcionando mais saúde às pessoas, produção de alimentos, melhoria do microclima das cidades, e etc. Ou seja, há um campo enorme de temas e soluções para desenvolver nesses assuntos. Desde o micro, no desenho de interiores, como o macro, nas grandes construções e até mesmo no planejamento urbano.
Seguindo essa linha, vemos o conceito de reuso ou Upcycling cada vez mais ativo no design de interiores. Seria a questão sustentável aplicada a uma escala menor, no universo da casa, do trabalho, do lazer. Objetos, móveis e luminárias refletindo o consumo consciente, buscando-se estender a vida útil das coisas através de soluções criativas e artísticas. O belo, o sustentável e o prático devem andar juntos, e há muito luxo nessa união. As peças de upcycling são únicas e sua produção impacta diretamente a economia local, incentivando artesãos e artistas, além de gerar um ambiente propício para que as pessoas se permitam inovar e criar objetos singulares e repletos de significado, onde pode-se proporcionar novos usos para peças com memória afetiva.
E nesse mundo globalizado em que vivemos, onde temos contato com diversos países e modos de vida, chegou-se a imaginar um futuro onde todos teriam um mesmo tipo de cultura, quase pasteurizado, onde as individualidades seriam massacradas. Seria o processo de interpenetração de culturas levado a um extremo.
No Brasil por exemplo, originalmente indígena, a influência das culturas europeia, africana e asiática, entre outras, formaram o que hoje entendemos como nossas características atuais, intrinsecamente miscigenadas.
O movimento que se percebe é que, na globalização, após uma curiosidade e um certo deslumbre pelas culturas diferentes, a consciência de uma necessidade de preservação das raízes, como maneira de se reconhecer como indivíduo, é forte.
Podemos usar o neologismo Glocal = Global + Local para compreendermos “a presença da dimensão local na produção de uma cultura global” (Roland Robertson, sociólogo).
Acima de tudo, podemos buscar o melhor de outras culturas e trazê-lo para o contexto da nossa existência, adequar os nossos interesses pelo mundo à nossa identidade.
O movimento Glocal também segue a mesma linha de sustentabilidade, quando estimula a arte e o artesanato, impactando positivamente a economia local, diminuindo o impacto da logística no seu consumo e fortalecendo a identidade cultural dos povos.
Por isso o novo luxo pode ser traduzido como autoconhecimento e sustentabilidade; encontra-se no detalhe, na excelência da elaboração, no cuidado com o meio ambiente e não na opulência. Se antes luxo era seguir padrões pré-estabelecidos, se adequar a grupos criadores de tendências, agora o importante é abraçar suas diferenças para criar espaços únicos.
O modo estético da Arquitetura é extremamente influenciado por essas questões, pois o acúmulo de experiências de uma vida de luxo acontece justamente nos diversos ambientes que frequentamos, nas nossas casas, escolas, trabalho, hotéis, restaurantes, e claro, na natureza.